Este estudo pretende
trabalhar a linguagem como prática social no cotidiano da Penitenciária Dr.
Francisco D’ Oliveira Conde, Presídio Estadual de Rio Branco, integrada ao
IAPEN (Instituto da Administração Penitenciária do Acre), destinada para homens
em cumprimento de pena privativa de liberdade, em regime provisório,
semi-fechado e fechado.
Neste trabalho optamos por delimitar a
pesquisa no “Estudo Discursivo dos detentos (1982-2010)”, ou seja, estudar os
repertórios lingüísticos tecidos no cotidiano prisional, buscando identificar
como se configuram essas distintas formas de resistência aos mecanismos de
controle do sistema penitenciário, buscando relacioná-lo sobre o viés da
história cultural, do cotidiano, do imaginário e social.
Percebemos que essa linguagem nova surgida nos
presídios são manifestações de resistências ao modelo disciplinador prisional,
estando totalmente influenciada pelo desprovimento cultural, social e econômico
de grande parte dessa massa carcerária. Esse neologismo artificial lingüístico
são formas de sociabilidade desenvolvida entre os apenados no cotidiano
prisional, que vem sendo criado e recriados ao longo da fundação do presídio
Dr. Francisco de Oliveira Conde sofrendo inovações até os dias atuais. Podemos
dizer que é a cultura da periferia em ação dentro do presídio, aperfeiçoando-se
contra a ordem vigente. As diversas formas de comunicação entre os apenados é
um fenômeno que desestabiliza os
mecanismos formais de controle social interno.
Essa pesquisa parte também de uma
experiência de trabalho de cinco anos realizados dentro da unidade prisional
enquanto funcionário na função de agente penitenciário. Nesta época já era
acadêmico do curso de história, portanto grande também já eram minhas
inquietações vivenciando no dia-a-dia a problemática prisional.
Um pouco antes de enveredar nesta
empreitada que até então desconhecia por completo, tivemos que passar por um
curso preparatório em Brasília, de modo que pela primeira vez tive o contato lá
no presídio da Papuda em Brasília. Mas o fato é que naquele ambiente, mesmo
tido por muitos como um presídio modelo, existia uma massa carcerária, com seu
modo de viver construído na dureza cotidiana do cárcere.
Lembro que na ida para o curso enquanto estudante de
História e sabendo que trabalharia em uma penitenciária, logo tive o primeiro
contato, mas por curiosidade, com a obra Vigiar
e Punir de Michael Foulcaut, sem saber que tal constitui um clássico para
todos que queiram embasa-se teoricamente ou tratar de alguma forma a questão
penitenciária, bem como a história da violência nas prisões. E toda prisão trás
em seu bojo o germe da violência.
A
maior descoberta que tive logo de início no contato com aqueles apenados, pode
se resumir em algumas passagens do prefácio de um livro da Juíza Odete Maria de
Oliveira denominado Prisão: um paradoxo
social.
“É da própria natureza humana levar
demasiadamente a sério a separação entre o bem e o mal e a sua
incomunicabilidade [...] Quando se trata de apenados, parece que isto resulta à
flor da pele: ele é o mal, o erro, passa-se a olhá-lo como configuração mesma
do pecado- é contagioso como a própria peste [Mas]”recluso não é mal [são]
preso-homem, um preso-gente, um preso portador de humanidade (Prefácio)
Assim, não demorou muito para perceber que o
ser humano estará sempre lutando para liberta-se, de opressões estabelecidas ou
resistindo, ou ate mesmo criando relações de solidariedade entre si e a
linguagem constitui, entre outras, representações culturais e sociais do
vivido. Portanto, esse estudo das práticas discursivas no presídio tem sua
razão de ser por afirmar e dar as vozes aos excluídos da história.
O
interesse pelo objeto de desta pesquisa tem sua razão em virtude deste futuro historiador
ter tido experiência de trabalho neste presídio. Em meados do ano 2000, pouco
antes de ingressar neste trabalho, tive o primeiro contato com essa realidade,
ou prática social cotidiana em um curso preparatório em Brasília.
Com
feito, tenho percebido que o ambiente prisional é um ambiente marcado por
políticas internas (dos guardas penitenciários, dos presos, da administração e
outros segmentos envolvidos), bem como diversas formas de representações
sociais e culturais, sobretudo às dos apenados. Essas representações de poder,
coletivas e individuais se dão conforme enfatiza Chartier ( 1990, p.25), ao
afirmar que:
As
práticas são mais especificamente costumes e modos de convivência, os modos de
vida, as atitudes, gerando padrões de vida cotidiana; em síntese, os modos de
fazer e viver. Já as representações seriam modos de ver; as visões de mundo
criadas pelas práticas e criadora das práticas. Assim as representações criam
práticas e as práticas criam representações. As representações sociais sobre determinado
objeto, ou sujeito, criam práticas sobre o objeto, ou sujeito; de tal modo, as
representações passam a ser a própria realidade.
Posteriormente
em consulta bibliográfica descobri que a pesquisa que pretendo desenvolver se
apresenta como um verdadeiro desafio, pois se faz necessário que seja feita uma
abordagem utilizando o método da História Oral, e como nosso ambiente tem suas
complicações, tais como o fato de ser uma área de segurança, dificuldade de
obter confiança e informações dos apenados, serão grandes obstáculos nesse
sentido.
Mesmo
assim, encontro determinação para desenvolvê-la, pois essa temática visa dá voz
aos marginais, sobretudo por sabermos que cada um tem a sua história, enfim são
os esquecidos da história. Claro que também tem sua história, que se encontra
perdida, os primeiros policiais militares, antes dos guardas penitenciários e
mesmo estes últimos estão fazendo sua história naquele conflituoso cotidiano.
Michael
Foucault coloca que os dispositivos de poder vão compor as formas de controle
social, atuando nos espaços visíveis e não visíveis por meio de mecanismo
coercitivos que controlam os loucos, os marginais ou até supostos marginais,
enfim definem e controlam socialmente os sujeitos que compõem o negativo da
ordem:
Os
dispositivos disciplinares produziram uma "penalidade da norma" que e
irredutível em seus princípios e seu funcionamento a penalidade tradicional da
lei. O pequeno tribunal que parece ter sede permanente nos edifícios da
disciplina, e às vezes toma a forma teatral do grande aparelho judiciário, não
deve iludir: ele não conduz, a não ser por algumas continuidades formais, os
mecanismos da justiça criminal ate a trama da existência cotidiana; ou ao menos
não e isso o essencial; as disciplinas inventaram apoiando-se alias sobre uma serie de
processos muito antigos um novo funcionamento punitivo, e este que pouco a
pouco investiu o grande aparelho exterior que parecia reproduzir modesta ou
ironicamente. (FOLCAULT, 2004, p.153)
Pela
breve pesquisa de monografias e experiências próprias podemos descrever
aspectos da realidade prisional da penitenciária Dr. Francisco de Oliveira
Conde. Existe atualmente alguns projetos em andamento que dizem ressocializar
ou recuperar o apenado tais como o projeto Pintando a Liberdade ou fábrica de
bola, além da Escola a qual alfabetiza pouquíssimo detentos, a cozinha e uma
horta. Estes são os trabalhos ditos ressocializantes.
No entanto, estamos longe da
ressocialização, pois segundo Foucault esse discurso de ressocialização é
apenas uma forma ideológica usada para dar continuidade a sociedade
disciplinar. Essas palavras: “regenerado” ou “recuperado”
conforme cita Marcus Vitorino em sua monografia de conclusão de curso de
História, tais discursos não passam de discursos políticos. Michael Foucault
descreve que a partir da prática judiciária lettre-de-cachet,
na França, todos que cometem erros e transgressões seriam sujeitos a este
regime disciplinar. Conforme o trecho abaixo:
A let-tre-de-cachet não era uma lei
ou um decreto, mas uma ordem do rei que concernia a uma
pessoa, individualmente,
obrigando.a a fazer alguma coisa. Podia-se até mesmo obrigar alguém a se casar
pela lettre-de-cachet. Na maioria das Vezes, porém, ela
era um instrumento de punição. quis
anular a íettre-de-cachete libertar os operários grevistas. Foi a própria
corporação dos relojoeiros que então solicitou ao rei que
não libertasse os operários e
fosse mantida a lettre-de-cachet. Vemos, portanto, como os controles
sociais, relativos aqui não mais à moralidade ou à religião mas a problemas de
trabalho, se exercem por baixo e por intermédio do sistema de lettre-de-cac/,et sobre a população operária
que está surgindo.
(FOUCAULT, 2001, p. 94-95)
Em linhas gerais uma breve
descrição de como se encontra a URS-FOC (Unidade de Recuperação Social
Francisco de Oliveira Conde) e a análise quanto aos projetos de recuperação. Os projetos
de ressocialização desenvolvidos
no presídio
Francisco de Oliveira Conde são projetos que têm surtido pouco efeito, pois poucos e existe uma série de
dificuldades para implantação de outros projetos, inclusive promovendo trabalho
externo. Mesmo assim, são maneiras de dá oportunidade para alguns presidiários
com bons comportamentos dentro do presídio que ainda não se
alfabetizaram ou trabalharam internamente, tirando alguns poucos da ociosidade
e da dureza do cárcere,
levando-os ao cumprimento de sua pena com remissão de dias de
sua pena.
Então, como já dissemos, esta
palavra deveria ser quase sem sentido e o Sistema Penitenciário Brasileiro está falido. Isto nos leva
a defender a visão foulcoltiana devendo considerar as penas mais como um castigo do
que uma oportunidade de recuperação. Nesse sentido,
[...]
a punição deve ser não mais um ritual que manifesta um poder, mas um sinal que
cria obstáculos à repetição do crime, um conjunto de representações, uma
“semio-técnica das punições” ou um poder “ideológico”. A utopia desse estilo
penal será a cidade punitiva com seus “mil pequenos teatros de castigo”, em que
a encenação das penas adequadas para cada criminoso visaria evitar, pela ação
dessas próprias representações, a proliferação de crimes e delitos
(FOUCAULT,1987, p.83,93 e 101).
A
questão prisional envolve uma série de problema, no entanto, sabemos que não
podemos formar campos de concentrações desumanos, se bem que os presídios no
país estejam lotados e em tristes condições. Outro problema refere-se à ligação
de empresas fornecedoras de todos os serviços e produtos, geralmente
enriquecendo e com elos políticos no governo local, de forma que favorece a
política de aumento do índice carcerário de qualquer modo e misturados, pois
nesse sentido o que prevalece são os números e numerários.
Na
sociedade disciplinar comprovam que o sistema capitalista tem sucesso em controlar o corpo, o direito de ir e vir,
enfim, de tornar dóceis as pessoas avessas aos padrões “morais” e
comportamentais da sociedade. E Brasil só existe pena de morte em caso de
guerra declarada, mesmo com todo esse não funcionamento do Sistema Penal, ainda
pode ser melhor que o suplício de outrora. Mas na linha foucaultiana de pensar
continua os rigores dos dispositivos da lei emanados politicamente da classe
dirigente, pois em Vigiar e Punir analisando
em breve artigo da Revista Aulas escrito por Saly da Silva, este fazendo uma
análise de Vigiar e Punir nos diz:
“as sociedades disciplinares são um tipo de poder que atravessa todos os
aparelhos e instituições”. No mesmo artigo descreve seguindo a linha foucaultiana:
“O postulado da subordinação encarnaria no aparelho do Estado e seria
subordinado a um modo de produção, como uma estrutura” (p.07).
Portanto,
este trabalho pretende estudar todo esse ambiente focalizando nos presos. Visa
trabalhar as relações conflituosas existentes no presídio Francisco de Oliveira
Conde, sendo estas analisadas por meio do Estudo das Práticas Discursivas,
ressaltando as vozes dos presos.
Não
querendo fazer afirmativas conclusivas, mas para quem viveu a realidade do
cotidiano prisional, podemos supor que tal ambiente é um lugar conflituoso em
sua essência. Lugar onde as imagens visíveis e não visíveis estão presente por
meio de dispositivos de poder e do imaginário dessa instituição, sejam eles
manifestações culturais, representações individuais e coletivas. O presídio
Francisco de Oliveira Conde, inaugurado em 1982, em meio ao alarido que o
colocava com sendo um presídio moderno e o grande solucionador da questão de
segurança, e do mal da sociedade, muitas vezes eram bêbados, “ladrões de
galinha”, ou presos de nenhum poder ofensivo, conforme assinala Vitorino (
2009, p.61)
[...] Naquela época ainda vigorava
no Código Penal o crime de vadiagem, por esta razão, “a partir de sexta-feira
várias pessoas são recolhidas às delegacias em decorrência de embriaguês”171,
ou por vagabundarem embriagadas. Alguns desses estabelecimentos eram bem
conhecidos e situavam-se no “famoso Bairro do Papôco”, lugar onde havia“ casas
noturnas, mulheres vendendo seus corpos, tiroteios, assaltos, diversos tipos de
bebida alcoólica e muito quebra-quebra.
3.
JUSTIFICATIVA
Este estudo discursivo sobre a
linguagem dos detentos do Presídio Francisco de Oliveira Conde poderá encontrar
manifestações resistência a linguagem jurídica e ao Sistema que os punem e os
vigiam muitas vezes com certa injustiça, sendo encarcerados em celas
superlotadas, sofrendo espancamentos, maus-tratos, tendo suas penas vencidas e
uma série de descumprimento da LEP (Lei de Execuções Penais). Podendo também
demonstrar um universo invisível dos presos, bem como suas malícias e elementos
transgressores que se não feito um estudo mais detalhado favorecerá uma total
(des)conciliação da harmonia prisional formal.
Consta
segundo dado da monografia de Marcus Vitorino, último trabalho defendido na
área de História sobre o presídio em estudo, que existem aproximadamente 15 ou
16 monografia da UFAC e outras Faculdades nos Cursos (Ciências Sociais, Serviço
Social, História e outros) diversos já abordaram o tema; mesmo que alguns de
forma bastante superficial. No entanto, trabalhar num enfoque dos Códigos de
Sustentação da Linguagem no Presídio Francisco de Oliveira Conde, pouco ou nada
foi até o presente momento abordado.
Tal
tema a princípio o seguinte título: “Dialeto da Resistência ou Linguagem
Criminosa: “As diversas formas de comunicação e Neologismos Artificiais
restrito entre os apenados do Presídio Francisco de Oliveira Conde”, mas pelo
fato de já está desenvolvendo um estudo na área da Violência e os Controles
Sociais, optei essa nova reformulação. Primeiro esse título era só uma idéia,
mas aos poucos foi afunilando e tornado mais concreto, sobretudo ao tomarmos
contato com a tese de doutorado da Socióloga Hilderline Câmara de Oliveira do
Rio Grande do Norte e outras pesquisas. Desse momento em diante ficou claro que
era possível, ou melhor, era de fato necessária essa pesquisa, por ser uma
lacuna. Por fim, por meio da Orientação da Professora Maria José Bezerra, foi
feito o recorte espacial, temporal e temático adequado, bem com obter as
indicações metodológicas e opções teóricas certas para esse estudo.
A
linguagem restrita aos apenados que são criadas e recriadas em todos os
presídios e manifestando-se com algumas diferenças de região para região.
Inegavelmente essa linguagem dos apenados resiste às normas que os punem e
vigiam, enfim, é uma resistência a normatização oficial. Assim, a linguagem
prisional caracteriza a Prática Social e construção de uma nova sociabilidade,
onde todos devem se adequar. Claro que essa linguagem construída pode ser utilizada
com malícia, fortalecendo os elos e vínculos de organizações aprisionadas.
Quanto à linguagem como prática social, observamos o que diz Hilderline
Oliveira:
[...] a linguagem enquanto prática
social torna-se elemento central para a sociabilidade humana. Ela é intrínseca
à ação do homem, cabendo assim, considerar e compreender a linguagem como
interação, ou melhor, como um modo de ação, que é social, portanto, dotada de
efeitos de sentido em função do espaço social e dos sujeitos que o compõem.
(OLIVEIRA, 2010, p.120)
A linguagem no presídio
faz referência a um grupo identitário, a idéia de pertencimento e relações de
interação. Como sabemos toda sociabilidade humana é simbolicamente constituída
e as representações simbólicas podem está manifestada de diversas formas numa
constituição imaginada da realidade social. Nos presídios:
espaço de
encarceramento os símbolos, gestos, expressões corporais faciais, o brilho nos
olhos percebido em algumas situações, tudo isso dentro de um contexto, pode ser
entendido como forma de comunicação, tanto a percepção de uma linguagem não
verbal, quanto à reação da mesma podem ser conscientes e/ou inconsciente.
(OLIVEIRA, 2010, p.123)
Daí que a linguagem unifica,
congrega os sentidos e os sujeitos. Assim, a importância de uma construção,
representação e identidade no presídio. A idéia de identidade nasce da questão
de pertencimento e do esforço contínuo de recriar a realidade de acordo com as
idéias padrões e suas semelhanças. Nos presídios ocorre a história do
cotidiano, sendo um espaço menor ou pequeno marcado pela micro-dominação. Isto
não quer dizer que o cotidiano não seja produto da dominação estrutural, ou
seja, resultado do capitalismo e ligar de promoção de alienação e imposição
brutal rotineiramente.
Como toda penitenciária a Francisco
de Oliveira conde é um “barril de pólvora”, pois constantemente eclodem motins
e rebeliões, acompanhadas de mortes entre presos e muita agressividade física e
psicológica. Um pouco antes do ingresso da primeira turma de agentes penitenciários
começarem a trabalhar no presídio havia acontecido algumas rebeliões no
presídio Francisco de Oliveira Conde. Em julho de 1999, publicado um breve
artigo intitulado: Segurança Urgente! Que começava assim:
Por mais que se tente abafar é notório a
insatisfação geral da população de nossa cidade com relação ao sistema de
segurança pública. Segurança Urgente! E sem dúvida nenhuma este é clamor da
sociedade acreana que se apavora com a crescente onda de violência e
criminalidade em nossa capital nos últimos dias.
O Governo
por sua vez, juntamente com a Secretaria de Segurança e Justiça do Acre,
infelizmente está deixando muito a desejar na tomada de uma solução urgente
para o problema que tanto afligem os acreanos. Sabemos que atual quadro da
polícia civil e militar existe uma necessidade iminente de renovação, ou seja,
é muito grande a defasagem e despreparo de agente de polícias, assim como de
servidores. Estes em sua maioria estão poucos qualificados para exercer essas
funções de modo satisfatório.
Nas
delegacias e, principalmente no Presídio Estadual, as condições de estruturas
não oferecem qualidade material e pessoal. Atualmente, os profissionais que
estão prestando serviço naquela Unidade de Detenção, (Corpo de Bombeiro e
Polícia Militar) são comprovadamente inadequados para prestarem um serviço com
qualidade civil-técnica e segurança necessária que proporcione tranqüilidade às
famílias de detentos que estão cumprindo pena neste Presídio. Além disso, estas
pessoas deveriam estar a serviço de toda à população.
Com efeito,
são comuns as fugas, as denuncias de truculências nesta Casa de Detenção, como
no último caso, que culminou com a morte de detento que teve sua cabeça
esfacelada por um tiro de fuzil, quando tentava fugir do presídio. (Jornal O Rio
Branco – Julho/1999).
Este trecho deste artigo
demonstrava o estado de desumanidade, pois neste presídio havia sido morto
recentemente um preso que teve sua cabeça esfacelada com um tiro de fuzil,
quando este tentava fugir do presídio, além de fazer denúncias relacionadas aos
caos da segurança em geral naquele momento.
Num artigo denominado O Território do Cotidiano de Deudedith
Junior é mencionado a relação de alteridade e entre a fronteira do outro e do
mundo; entre as diferenças diversas e
limitações é que as existências, os pensamentos condicionados sócio-econômico e
culturais nessa conjuntura ensejam a formação de construções identitárias.
Mesmo sendo comumente o cotidiano
considerado algo absolutamente previsível, não podemos negar os processos de rupturas,
por meio de uma tempestuosa série de eventos conflituosos. O cotidiano
estabelece os códigos de sustentação do que pode e do que não pode, do que deve
e do que não dentro deste determinado ambiente cultural, sendo dessa forma
forjados os conflitos que culminam em violência prisional. Assim, mesmo após o
ingresso dos agentes penitenciários muitos conflitos cotidianos e violências
sempre existiram tal como existe até
hoje.
Partindo
do entendimento de que toda realidade é representada por meio através dos
discursos, constituindo estes numa inesgotável fonte de múltiplos símbolos e
valores construído cultural, econômico e socialmente, podemos então dá voz aos
discursos dos detentos do Presídio Francisco de Oliveira Conde.
Para isso, estudaremos como se
manifestam as teias e as redes de relações sociais e de poder na
micro-história, sem atentamos diretamente para uma classe dominante, mas vários
grupos dentro do ambiente prisional.
Ressaltando que haverá sempre ora
relações de dependências, ora relações conflituosas. Mas o que propomos
descobrir por meio dos estudos destes discursos é como são forjadas as
identidades dos prisioneiros, pois bem sabemos que o ambiente prisional é
degradante, desumano, generalizado quando colocam todos presos como não
humanos. De modo que tal visão generalizante transmite erroneamente a
penitenciária tão somente como espaço e escola do crime e sofrimento, enfim
lugar dejetos humanos.
Portanto, nossa maior missão seria
mostrar que cada preso tem sua história, sua trajetória que coincidentemente
são a história dos excluídos e marginalizados. Possivelmente o neologismo
lingüístico é fruto de uma grande camada de
marginalizados ex-presídio que no sincretismo com a cultura prisional resiste
ao rigor formal do cárcere.
No entanto, a punição
já está na consciência coletiva. Ou seja, a punição contra atitudes
individuais. Percebemos que o sistema capitalista tem sucesso no controle dos
corpos e em retirar o direito de liberdade, bem como criar estereótipos que no
dizer de Michele Perrot “...o pobre e,
particularmente, o operário. Eles enchem as prisões a tal ponto que passam a
concebidas para eles, em função do seu nível econômico e cultural”.
A
Linguagem prisional na forma dos discursos dos detentos podem muito bem
constatar que a pobreza e a miséria solo propício, em meio à exclusão, ao
preconceito e ao desajuste familiar, onde agregado forma um ambiente fértil
para que surja a cultura da violência como sobrevivência, manifestada de várias
maneiras em nossa sociedade. Eis o nosso problema.
Analisar
as práticas discursivas cotidianas dos apenados do presídio Francisco de
Oliveira Conde, dando ênfase a questões relativas à condição de exclusão
social, as trajetórias destes antes e após a experiência de ser apenado e as
representações que eles constroem de si mesmos, da unidade prisional e da
sociedade extra presídio.
O referencial teórico será
objetivado sempre na construção e compreensão do
objeto de estudo fundamentaram-se em autores que discutem sobre a prisão, como:
Foucault em Vigiar e punir, Ordem
A verdade e as formas Jurídicas e a Ordem do Discurso
e outras obras deste autor. Temos que ressaltar que a primeira obra Vigiar e Punir será a de mais valia, pois poderemos ver os
dispositivos de poder e a forma que vão se compor desde o século XVII, ou seja
do suplício as prisões modernas, enfim os mecanismos coercitivos que controlam
e punem os loucos, os ditos marginais e marginais propriamente ditos, bem como
os sujeitos que se contrapõem a ordem vigente.
Especificamente a Análise discursiva
em meio as representações sociais, coletivas e simbólicas nos levará a ler
principalmente de Eni Puccineli Orlandi, pois nesta
autora teríamos todo arcabouço teórico
que permeia o processo social de produção da linguagem, seja esta institucional
ou marginal e desviante. Além do mais, podemos estudar a obra de Bourdier as
formas do silêncio no movimento dos sentidos e simbolismo o que nos faz
enveredar na análise de discurso Francesa.
História e cotidiano, de Agner
Heller será obra de fundamental importância, pois esta autora analisa o
cotidiano com um engendra mento das manipulações de sociabilidade. Esta autora
trás a noção de que toda história é acontecida no cotidiano, no dia-dia em meio
ao conflito ou pacificação, onde o cotidiano trás muitas vezes concepções
pluralizantes ou relativas, enfim a vida cotidiana é a vida do homem inteiro,
nas suas paixões, desilusões, padrões culturais e etc.
Pretendemos trabalhar com Roger Charter, pois
este autor trata bem os conceitos de representações coletivas, sociais e
individuais. Percebemos também neste autor um trabalho com os “utensílios
mentais” que nos dará explicações quando o imaginário representativo do objeto
em foco.
Memória e história, de Jacques Le Goff também
será de grande importância, haja visto que o ambiente do qual devo desenvolver
a pesquisa são instituições de memória guardadas material que são os documentos
e monumentos ou qualquer outros artefato com marcas humanas. E memória é fazer
recordar: tanto o documento com o monumento” é tudo aquilo que pode evocar o
passado, perpetuar e recordação, por exemplo, os atos escritos.
Os excluídos da história, de Michelle
Perrot, na terceira parte de seu livro há uma tratamento sobre a questão dos
prisioneiros, que segundo a autora são parte integrante dos excluídos da
história, ou seja, a prisão é uma exclusão. Para isso, analisa o sistema
Penitenciário no Século XIX, bem como a delinqüência, acabando por afirma por
meio de seu minucioso estudo às fontes documentais de presídios antigos que a
prisão é um lugar sombrio e lugar de despejo dos pobres e subproletaiados.
Com relação aos procedimentos metodológicos
serão entrevistas abertas, por meio da Abordagem da História Oral, bem como
questionários aplicados, com detentos, familiares de detentos, ressaltando que
as entrevistas serão feitas também com funcionários e a administração do
presídio, além de pesquisas nos arquivos do presídio, setor de cadastro do
presídio, da Vara Criminal, onde estão os autos dos processos envolvendo os
detentos, no CDIH da UFAC, com leituras de jornais com A Gazeta e o Rio Branco,
principalmente nos primeiros anos da década de 80, quando da fundação do
Presídio. Além, de leitura de uma larga bibliografia correlacionada.
Não querendo apossar-se
inteiramente do discurso midiático, que coloca as classes pobres e paupérrimas,
como “classes perigosas”, colocando-as sempre como propagadoras de violências,
pretendemos abordar o objeto da pesquisa na perspectiva da crítica ao Estado
com base nas reflexões de Foucault e outros pensadores.
Também, no aspecto
metodológico, o estudo se situa numa abordagem qualitativa, que tem como
instrumento principal a entrevista e questionários. A investigação só será
possível mediante a utilização de instrumentos de coleta de dados, tipo
gravador digital. Temos que visar que teremos que ter uma vivência no ambiente,
observando diretamente no cotidiano prisional e registrando no diário de campo
como procedimento etnográfico do pesquisador, a análise documental dos
prontuários dos internos e a aplicação de entrevista semi-estruturada, junto
aos sujeitos da pesquisa.
Enfim, sabemos que poderemos enveredar por vários
caminhos nessa instigante viagem que é a pesquisa, podemos inclusive mudar de
rota; mas jamais teremos a pretensão de sermos portadores de uma verdade
absoluta. Aqui, tem-se um roteiro flexível, um início de uma discussão a ser
feita. Pois, críticas são muitas vezes construtivas; assim, ouso a questionar Instituições de forma
responsável. Assim, como continuo a sonhar com um mundo melhor.
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