FICHAMENTOS:
SOCIEDADE FEBRIL
“[...] A preocupação inicial do projeto era reconstruir a
experiência de negros escravos, libertos e livres nos cortiços cariocas...”
(p.07)
“[...]lutas contra a escravidão nas últimas décadas do
período monárquico...”(p.07).
“[...] testemunhas irretocáveis sobre a relevância das
solidariedades construídas nos cortiços para luta dos negros pela liberdade...”
(p.07).
Em consulta a tese de doutorado do Prof.º Carlos Eduardo Moreira de
Araújo, que tem pelo título: Cárceres
Imperiais: A Casa de Correção do Rio
de Janeiro. Seus detentos e o sistema no Império, 1830 – 1861. Tendo como
Orientador o autor do livro a ser fichado temos relatos do “ primeiro grupo de
sessenta condenados à prisão com trabalho chegou ao canteiro de obras em
janeiro de 1834. Contudo, não foram os únicos que participaram desta
empreitada. Africanos livres, escravos (alugados ou presos por fugitivos),
trabalhadores livres (artífices e mestre), e ainda os considerados “vadios e
desordeiros”, foram utilizados para a execução do projeto.”
Daí que podemos observar que, a prisão já surge com potenciais
construtores e moradores dela.
Fazendo uma analogia do o texto para o fichado, observamos que as
correntes das senzalas já aprisionavam e ainda continua aprisionando, perseguindo
e estigmatizando camadas sociais pobres
ditas perigosas, viciadas, promíscuas discurso este Policialesco e midiático
valorizando a forte repressão aos pobres e grupos minoritários, tal qual a
política de destruição e higienização política no final XIX no Brasil e em todas épocas.
Da mesma forma deu-se a inauguração do Presídio Dr. Francisco de Oliveira
Conde no Acre (1983), que no ato de inauguração houve uma forte propaganda,
onde para fortalecer o discurso os jornais divulgavam notícias hilárias de
violência pouco antes da inauguração.
E quem era e sempre são os noticiados? A “classe perigosa” que por ser
pobre pode naturalmente os bêbados, pedintes, meretrizes, ladrões e vadios
viciados. Tal discurso colabora para manter um clima de afastamento, isolamento
ou clausura destes.
Sempre no entre-grades, sofrendo por tal discurso legítima generalização,
ações da polícia violenta, enfim, vê-se uma necessidade sempre de mandá-lo para
o mundo do invisível.
Além disso, eram considerados doentes.
Ou seja: um discurso colonizador, discriminador, xenofóbico, racistas ainda tem
muito prevalecido para disfarçar um abismo de desigualdade social.
Todas políticas
da época deste as formações dos cortiços, casabres, comunidades coletivas
de escravos do período que antecede a Proclamação da
República, de desmoronamento e despejo no XIX, sobretudo no Rio de janeiro,
eram movidas administrativa e tecnicamente baseada na ideologia das “classes
perigosas”. Tudo isso, no conceito de Mary Carpaeter que a formulou, com
luperproletariado, uma espécie de escoria da sociedade, quem já havia passado
pela prisão, furtavam, eram incivilizados. Para destruírem os cortiços e as
áreas urbanas teriam que acabar com uma suposta cultura da pobreza promíscua,
enfim, livrar-se desse bando.
“ Os cortiços
supostamente geravam e nutria “o veneno” causador do vômito preto. Era preciso,
dizia-se, intervir radicalmente na cidade para
eliminar tais habitações coletivas e afastar do centro da capital as
classes perigosas que nele residiam. Classes duplamente perigosas, porque
propagavam a doença e desafiavam políticas de controle social...”(p.08)
Hoje temos visível esse modelo, onde para o embelezamento da cidade,
arranca formas diversas de ganhar a
vida, através de pequenos comércios, perseguição a vendedores ambulantes,
pessoas afastadas do centro tornando bairrista, em bairros pobres. I
Isto por que para muitos maltrapilhos perambular pelo centro da cidade,
poderá ser abordado pela polícia, daí ficarem muitos no “entre–grades”,
bandidos, que muitas vezes, não são tão perigosas.
“ Os cortiços
supostamente geravam e nutriam “o veneno” causador do vômito preto. Era
preciso, dizia-se intervir radicalmente na cidade na cidade para eliminar tais habitações coletivas e
afastar do centro da capital as “classes perigosas” que nele residiam. Classes
duplamente perigosas, porque propagavam a doença e desafiavam as políticas de
controle social no meio urbano...”
História
construída no entrelaçamento de muitas historias, a da febre amarela convergiu
sistematicamente para a história das transformações políticas de dominação e
nas ideologias raciais”(p.08)
Essa política de higienização e controle social até hoje é aplicada nos
presídios, que como o próprio Ministro da justiça atual, declarou serem
verdadeiros campos de concentração.
Também comum é vermos chacinas e atentados violentos contra moradores de
ruas, ou que estão por algum motivo nas ruas. Grandes são seus dramas,
perseguidos, sem lugares para dormir e fazer suas necessidades básicas.
Também vimos com tristeza a chacina ou quase genocídios de 111 presos na
Casa de detenção Carandiru, prova da vontade de eliminar sem piedade tais
seguimentos, sendo que é cada vez mais forte tratar os conflitos
sócio-culturais, impondo severa violência, e massificando essa ideia para
justiçar uma discriminação, um preconceito aceito por todos...que nem sabem às
vezes que também estão incluídos como classes perigosas.
“ [...] os
doutores praticamente ignoravam, por exemplo, uma doença como a tuberculose,
que eles próprios considerava especialmente grave entre a população negra do
Rio.”(09).
“Numa segunda etapa, a
iniciar-se nos primeiros anos da República, serão analisadas mudanças do modelo
prisional, ocorridas em função da reforma urbana do Rio de Janeiro, promovida
por Pereira Passos e outros que o
sucederam. Quais as novas formas de encarceramento e punição e quem são
os indivíduos que serão então aprisionados e excluídos do convívio social? O
final dessa etapa será marcado pelos anos de 1930,marco de um novo projeto de
Estado Nacional.”
As greves do ABC paulista, liderado
pelo então Sindicalista metalúrgico, Luiz Inácio, no final da década de 70,
tinha a repressão do Estado para qualquer possível não entendimento e
aglomeração de trabalhadores, exemplo este de uma aplicação de uma política de
controle social no meio urbano. Sendo que ao redor das fábricas, contrastava as
mansões dos altos diretores das montadoras de carros com a absoluta
precariedade dos casebres insalubres e desumanos dos trabalhadores e moradores.
Daí serem tidos como Classes perigosas.
Os cortiços eram lugares de resistência
e manifestação cultural, tanto que quando os moradores se transferiram para os
morros, veio logo brotar a questão musical, o samba e protestos. Isso um
cotidiano de dificuldades, sempre tentando fazer-se enquanto sujeitos excluídos
e divididos entre a dominação do Estado deixando ao esquecimento, em termos de
ajuda. Porém, agindo de forma discriminatória. Isto de um lado, por outro o
meio termo ao apoio a um dos o mais agravantes, que foi a formação dos grupos
aplicando A Violência como Estratégia para sobrevivência, resultando numa
guerra urbana.
Dentro dos morros muita cultura brotou
contrária aos cânones padrões. Cultura esta se disseminou. Tão a noção do termo
“malandro” entendida como um sujeito esperto, e não como um bandido, o chamado
“bixo” entre tantas gírias, conceitos próprios, que contradiz o vernáculo dos
doutores. Daí construírem sua linguagem,
e modo de viver.
Nesse caso podemos dizer que a prisão
já nasceu aqui, com os próprios construtores negros e seguimentos excluídos,
dentro delas. Vivemos aqui uma senzala moderna.
“O Panoptismo
– o olho
que tudo vê - é um modelo disciplinar, carceral, em que a vigilância se
estabelece virtualmente sobre aqueles que são vigiados, sejam eles
prisioneiros, trabalhadores das fábricas, alunos de escolas, doentes em
hospitais, soldados na caserna, etc. A idéia central deste modelo de vigilância
carceral era a de ver sem ser visto. A conduta é afetada e assume a normalização da disciplina, com o passar do
tempo, mesmo que não haja um vigilante, que observa sem ser visto pelo vigiado.
Idealizado por Jeremy
Bentham, trata-se de um
projeto arquitetônico que visava ordenar o espaço das prisões, como um
dispositivo ou uma tecnologia a serviço da fiscalização e do controle
disciplinar. Apesar de tal modelo nunca ter sido de fato construído, tal como
foi minuciosamente definido no projeto de Bentham, tratou-se de uma
manifestação ideal e
mental de uma função de poder – disciplinar – que se efetuou em inúmeras outras
instituições emergentes no século XIX. Tal modelo foi denominado de panoptismo
por Michel
Foucault, em Vigiar e Punir: nascimento da prisão. Petrópolis: Vozes,
1987; ver também FOUCAULT, M. A verdade e as formas
jurídicas. Rio de Janeiro: Nau Ed, 1996.”
A
Revolta da vacina... centenas de revoltados presos, alguns mortos e enviados quando
não mortos pelo caminho, formam mandados para o Acre, como se fosse um Prisão
Sem Muro...
“[...]
nem sequer sabia que a famosa Revolta da Vacina, em 1904, fora talvez a
“celebração” [da introdução da política higienista].
Uma
Operação de Guerra...
“[...]
Três dias antes os proprietários do cortiço haviam recebido uma intimação da
Intendência Municipal para que providenciassem o despejo dos moradores, seguido
da demolição imediata de todas as casinhas. A intimação não fora obedecida, e o
prefeito Barata Ribeiro prometia dar cabo do cortiço à força. Às sete horas e
trinta minutos da noite, uma tropa do primeiro batalhão de infantaria,
comandada pelo tenente Santiago, invadiu a estalagem, proibindo o ingresso e a
saída de qualquer pessoa.” (p. 15).
O cortiço Cabeça de Porco sofreu
então uma repressiva ação de despejos, sob os assim chamados “valhacouto de
desordeiros
“[...] Os trabalhadores começavam
a destelhar as casas quando saíram de algumas crianças e mulheres carregando
móveis, colchões e tudo o mais que conseguiam retirar a tempo. Terminada a
demolição da ala esquerda, em cujas casinhas ainda havia sabidamente moradores.
Várias famílias se recusavam a sair, retirando quando os escombros começava a
chover sobre suas sobre suas cabeças. Mulheres e homens que saíam daqueles
quartos “estreitos e infectos” iam às autoridades implorar que “os deixasse
permanecer ali por mais 24 horas...” (p. 17).
A cena descrita é comovente, como
comovente são todos projetos de despejos e higienização feito através de imperativos
do Estado e as classes dominantes. Tal como ocorreu aqui no Acre com a chegada
dos paulistas e expulsão dos seringueiros que foram fazer-se seu modo de viver,
nas cidades, lutando contra a pobreza e por uma vida digna para seus filhos em
diversas cidades do estado.
Resultado, poucos conquistaram seu espaço com
dignidade, o que gerou uma parte destes, em meio a prostituição e
marginalidade, ou simplesmente pela origem humilde, alguns pensam serem isso.
Num processo de discriminação, para os que por falta de oportunidade não
alcançaram o ritmo da competição e consumismo capitalista se estabilizar
sócio-economicamente.
O destino dos moradores
despejados....foram para o mundo do invisível, como em todo despejo de pobres,
os sempre suspeitos e sujeitados. Na verdade começa as formações dos morros
cariocas nessa época.
“[...] nem bem se anuciava o fim
dos cortiços, e a cidade do Rio já entrava no século das favelas...”(p.17).
“[...]A moral da história do JB é
que Barata Ribeiro, homem pequeno e magricela, devia ser um Hécules dos “novos”
tempos, e sua missão era purificar a cidade, livrando-a definitivamente daquele
“mundo de imundice”(p.19).
“[...] O episódio da destruição
do Cabeça de Porco se transformou num dos marcos iniciais, num mito de origens
mesmo, de toda forma de conceber a gestão das diferenças sociais...
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